segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

A cidade e sua morfologia urbana


1.1   – A cidade
“Cidade refere-se a um 
aglomerado populacional que a dada altura foi elevado a esta categoria por uma entidade política-administrativa” [A cidade em Portugal- Teresa Barata Salgueiro]
     - Geograficamente cidade é uma forma de povoamento  - É uma entidade individualizada com certa dimensão e densidade onde se desenrola um conjunto expressivo e diversificado de atividades
A cidade é antes de tudo um espaço produzido resultante do meio físico e da ação humana.
A forma de uma cidade não só depende da sociedade que a produz, mas também de teorias e posições culturais e estéticas de quem a idealiza e constrói.






1.2   -  Morfologia Urbana
Estudo da forma física do espaço urbano e sua evolução em relação a mudanças sociais, econômicas e demográficas.
            - Ciência que estuda as formas e as interliga com os fenômenos que lhes deram origem.
-Para Lamas a morfologia estuda os aspectos exteriores do meio urbano e suas relações recíprocas

A forma urbana e sua análise


A arquitectura deverá estar presente e intervir, qualquer que seja a escala ou o tempo  de intervenção, desde a vasta região á pequena habitação.” José Lamas


      Em seu sentido literal a palavra forma significa aquilo que confere um feitio, uma determinada aparência, um conjunto de limites exteriores de determinado objeto. Não existe arquitetura sem forma  ; é um meio para se alcançar a resposta para uma demanda e esta está diretamente relacionada a função.
       Para José Lamas  “ A construção do espaço físico [da cidade] passa necessariamente pela arquitetura, correspondendo assim a noção de forma urbana “ao meio urbano como arquitetura, ou seja, um conjunto de objetos arquitetônicos ligados entre si por relações espaciais”. A arquitetura como sendo a chave da interpretação correta e global da cidade como estrutura espacial.  Já para Bruno Zevi  o espaço é o elemento-chave da composição arquitetônica . Uma vez que a cidade é constituída por espaços interiores, ‘’definidos perfeitamente pelo obra arquitetônica’’, e por espaços ‘’exteriores ou urbanísticas, encerrados nessa obras e nas contíguas’’, a  construção do seu espaço físico resulta na sua arquitetura.
       Contudo, é importante ressaltar que a cidade não é somente uma estrutura espacial, mas também como resultado da sociedade que a produz e das condições históricas, sociais, econômicas e políticas em que essa sociedade gera o seu espaço e o habita. Sendo assim, a forma da cidade é determinada também pela sua apropriação social e cultural.
        Na análise da forma urbana a leitura da cidade deverá ser feita simultaneamente a diversas dimensões e escalas, ou seja,  em diversos níveis. Segundo Lamas “a compreensão e concepção das formas urbanas ou do território coloca-se a diferentes níveis, diferenciados pelas unidades de leitura e de concepção”, optando por trabalhar fundamentalmente com duas dimensões, designadas por  “dimensão territorial” (à escala da cidade) e por “dimensão urbana” ( à escala do bairro), permitindo fazer leituras dos diversos elementos morfológicos. Enquanto na dimensão territorial os elementos morfológicos  identificam-se como bairros, as grandes infra-estruturas, entre outros, na dimensão urbana, são os traçados e praças, os quarteirões e monumentos.
     A cidade é o resultado de um conjunto de fragmentos os quais só tem coerência se forem pensados e integrados num espaço maior que é a própria cidade.

Os espaços públicos urbanos


Para o urbanista os espaços públicos urbanos são espaços exteriores, livres e abertos, com zonas públicas, movimento e atividades.

O autor do livro Espace Urbain – vacabulaire et morphologie diz que o espaço público e espaço público livre são diferentes e essa diferença consistem em que o “espaço público” corresponde ao seu espaço livre e ao cenário arquitetônico que o envolve, ou seja, ao conjunto dos seus elementos construídos e não construídos, o “espaço público livre” tem apenas em atenção os arranjos da via pública e a iluminação.




Central Park, Nova York

Segundo Jan Gehl e Lars Gemzøe, “a via pública que proporcionava acesso e conectava os vários usos da cidade”. Assim, os espaços públicos são lugares de encontro, de comércio 
e de circulação, que oferecem e asseguram uma multiplicidade de usos.

Para Camillo Sitte, hoje, os espaços públicos constituem importantes lugares de lazer, de passeio, de descanso, de cultura, de práticas desportivas ou, ainda, áreas de preservação ambiental. 





Sitte alerta ainda para a questão do trânsito nas ruas, considerando que é um fator de opressão do espaço, e como tal deverá ser transferido “para um lugar onde ele não incomode, mas que seja útil”. Assim como a importância do verde e da água na cidade, defendendo que a sua introdução no meio urbano não só tem benefícios para a saúde, como também para o “êxtase do espírito” que encontra repouso nestes espaços naturais espalhados pela cidade.



Segundo Camillo Sitte, a permanência de “velhas e solitárias árvores” ou de pequenos grupos de árvores na cidade, formamagradáveis recantos com sombra que convidam ao descanso.

Estes espaços da cidade, sobretudo as praças e os jardins, devem ser repousantes e oferecer proteção não só do sol e dos diferentes elementos climáticos (vento e precipitação), mas também do tumulto e dos ruídos das ruas. 



Os espaços públicos devem ainda ter um papel unificador na cidade, ligando o “antigo” ao “novo” de forma a que não ocorram processos de segregação.

A morfologia urbana das cidades portuguesas

 Arquitectura Arquitetura Cidades Estrela Fortaleza Fortificacao Urbanismo Engenharia Militar
Almeida, Portugal

    As peculiares características morfológicas das cidades portuguesas devem-se à origem da cultura urbana portuguesa, à escolha dos locais de implantação, à adequação do traçado à topografia local, à localização de edifícios singulares em conformidade com a topografia, e à influência destes no traçado urbano.

A cultura urbana portuguesa tem influências das culturas grega, romana e muçulmana, resultando nas malhas urbanas do tipo vernáculas, e ainda nas eruditas. No primeiro caso, a malha é menos regular, baseando-se em edifícios singulares civis ou religiosos, geralmente localizadas em regiões elevadas da cidade, a partir dos quais o sentido da malha urbana começa a se desenvolver. Já os modelos eruditos são planejados com um traçado regular, sendo definida uma boa ordem geométrica. As cidades portuguesas são o resultado da soma dos elementos vernaculares e eruditos, e os diferentes momentos históricos goram cruciais na forma de se construí-las.

Verificou-se que quanto maior era o controle central do poder, maior a componente erudita no traçado das cidades, que se tornou visível nos traçados regulares medievais, renascentistas, ligados às fortificações, iluministas, barrocos e nos da era pós industrial.

Segundo Manuel Teixeira, as cidades medievais tinham quarteirões retangulares alongados, com  lotes estreitos orientados com uma frente pára a rua principal e outra frente para a rua das traseiras, sendo cortadas por vias perpendiculares. As praças não existiam e iam se estruturando gradualmente. Apresentavam também muralhas defensivas.

A partir do século XV, ocorreu um movimento de renovação urbana, com o objetivo de fazer intervenções para a criação de praças e edifícios institucionais que as estruturassem, como igrejas Matrizes, casas de Misericórdias e de Câmara.



Os desafios do séc. XVII, a nível urbanístico, para Portugal, foram norteados por dois fatores: A Independência, que resultaram em cidades com necessidades de sistemas defensivos e a necessidade de ocupar os novos territórios ultramarinos. Esses fatores influenciaram diretamente no traçado das cidades que apresentavam cinturas de fortificação, que possuíam cortinas e baluartes, fossos e esplanadas. A existência de fortes, redutos e baterias. Era constante a presença de edifícios militares, junto as muralhas e separados da cidade pela estrada de armas que acompanhava o perímetro das fortificações.



O século XIX, caracterizado pela continuidade da cidade clássica e barroca e surgimento de novas tipologias que vão preparando a cidade moderna, ou seja, os traçados regulares, quadrículas, ruas avenidas e praças foram somados, agora a jardins, parques alamedas, passeios públicos, e avenidas. 
Foram grandes transformações nesse período nas cidades, onde muralhas foram destruídas dando lugar a grandes jardins e alamedas, tendência que perdurou pelo século XX até a segunda guerra mundial. Portugal, como todos os países da Europa passaram pela imposição do progresso e cosmopolitismo, tendo Paris o principal modelo da época.  No século XX, continuou com a influência “urbanística formal”, do urbanismo moderno e da Carta de Atenas, que previa a conservação parcial e limitada dos centros históricos, no entanto, desde o século XIX, houve a crescente abstração aos espaços e a decorrente ameaça da perca da originalidade, tornando-os cada vez mais globalizados.

A partir dos anos 60 houve um novo olhar para o patrimônio, tendo o centro da cidade sido redescoberto, surgindo um movimento de remodelação, melhoramento do habitat. Em suma as cidade portuguesa, teve grande coerência interna, não obstante aos modelos da época, não se abstraiu, procurando responder a realidade material e cultural de cada situação.

Os primeiros núcleos urbanos construídos fora do território continental - o exemplo das cidades das Ilhas Atlânticas

          A expansão marítima portuguesa começou no século XV, quando os arquipélagos da Madeira e dos Açores foram descobertos e ocupados. Com a colonização desses arquipélagos, esses se transformaram em áreas pioneiras de experimentação e depois de modelo de referência.
         Tendo como exemplo essas cidades das lhas Atlânticas, é possível perceber que os portugueses tinham a capacidade de compreender e articular as suas cidades com o território. Com um modelo de cidade como base, que eram as cidades construídas no continente, os colonos adaptavam intuitivamente esse modelo às características de cada lugar.
          Essas cidades insulares apresentavam características semelhantes no que se dizia a sua localização junto à costa, na escolha do sítio para a implantação do núcleo original e no traçado das ruas. De modo geral, os núcleos urbanos primitivos eram implantados em baías abrigadas e com boa capacidade de defesa.

Semelhança das características morfológicas das cidades insulares

O Duque D. Manuel foi de papel importantíssimo na história de Funchal, no arquipélago da Madeira. Foi ele  quem modernizou a então vila, mandando construir a igreja e um novo setor da malha urbana, composto por um conjunto de quarteirões organizados segundo uma estrutura ortogonal regular.
Sendo assim, pode-se afirmar que essas mudanças podem ser consideradas uma inovação na prática urbanística portuguesa porque resultou de uma estratégia de desenvolvimento e de modernização urbana.


Foi nessas cidades dos arquipélagos da Madeira e dos Açores que se fez a síntese entre a prática do planejamento medieval e os princípios teóricos emergentes do urbanismo renascentista.